O trastuzumabe deruxtecana, comercialmente conhecido como Enhertu, é um medicamento de alto custo que frequentemente gera dúvidas entre pacientes, especialmente quando há negativa de cobertura pelo plano de saúde para tratamentos fora da bula (uso off label).
Essa situação é comum quando o paciente recebe recomendação médica para uso do medicamento em doenças diferentes daquelas previstas na bula aprovada pela Anvisa, que atualmente contempla o tratamento do câncer de mama HER2+.
Diante da negativa das operadoras, surgem questionamentos importantes sobre os direitos do paciente, a legalidade da recusa e quais medidas podem ser avaliadas para buscar o custeio do tratamento.
Em determinados casos, a via judicial pode ser analisada, especialmente quando há prescrição médica fundamentada em evidências científicas.
E, ao longo deste artigo, você vai entender em quais situações o trastuzumabe deruxtecana pode ser obtido pelo plano de saúde e quando pode ser necessária a adoção de medidas jurídicas.
O que você verá aqui:
O trastuzumabe deruxtecana é um anticorpo conjugado que teve registro aprovado pela Anvisa para uso no Brasil.
De acordo com a bula, o medicamento é indicado para o tratamento de pacientes com câncer de mama HER2 positivo irressecável ou metastático, que já tenham sido submetidas a pelo menos duas linhas anteriores de tratamento sistêmico na fase avançada da doença.
A aprovação da Anvisa foi baseada nos resultados de um estudo científico que demonstrou a eficácia da medicação para o tratamento de pacientes acometidas para este tipo específico de câncer de mama.
Os resultados positivos do trastuzumabe deruxtecan para o tratamento do câncer de mama Her2+ foram amplamente discutidos, inclusive, na última ASCO (American Society of Clinical Oncology), uma das principais conferências internacionais na área da oncologia.
De acordo com os resultados do estudo DESTINY-Breast 04, apresentados durante o evento, o medicamento proporcionou aumento significativo da sobrevida livre de progressão, bem como da sobrevida global dos pacientes avaliados.
Além disso, o trastuzumabe deruxtecana vem sendo estudado para o tratamento de outros tipos de tumores, especialmente após a divulgação de resultados positivos em pesquisas apresentadas em edições recentes da ASCO.
A Food and Drug Administration (FDA), órgão regulador norte-americano equivalente à Anvisa, analisou esses estudos e aprovou o uso do trastuzumabe deruxtecan para o tratamento do câncer de pulmão, tendo com base justamente os dados publicados pela ASCO.
No Brasil, embora o medicamento ainda não possua registro específico para outras indicações, seu uso tem sido recomendado por médicos em determinados casos de câncer de pulmão HER2 positivo, câncer gástrico HER2 positivo e adenocarcinoma da junção esofagogástrica.
Essas recomendações se fundamentam em evidências científicas que indicam a eficácia do medicamento nesses contextos clínicos.
Esse tipo de prescrição é conhecido como uso off label, termo utilizado quando um medicamento é indicado para uma finalidade diferente daquelas previstas em bula, desde que exista respaldo científico e justificativa médica para a sua utilização.
O trastutuzumabe deruxtecana é um conjugado droga-anticorpo. Ou seja, é um quimioterápico ligado a um anticorpo que tem como alvo algum elemento da célula cancerígena.
No caso específico do trastuzumabe deruxtecana, o alvo é a proteína Her2 que, em alguns tipos de tumor, está presente nas células malignas.
Por isso, este é um medicamento indicado para o tratamento de cânceres Her2+.
Em comparação com a quimioterapia convencional, o grande ganho de utilizar um conjugado droga-anticorpo, como o trastuzumabe deruxtecan, é que as células saudáveis não são afetadas pelo tratamento, já que a medicação age diretamente nas células cancerígenas.
Atualmente, o preço do trastuzumabe deruxtecan pode chegar a R$147.038,97 por aplicação. Este valor foi obtido a partir de orçamentos elaborados por hospitais.
Ou seja, estamos falando de um medicamento de alto custo, cujo valor costuma ser incompatível com a capacidade financeira da maioria dos pacientes.
Diante desse cenário, a discussão sobre a cobertura do trastuzumabe deruxtecan pelos planos de saúde torna-se recorrente, especialmente quando há prescrição médica fundamentada.
Sim. Havendo prescrição médica fundamentada em critérios técnicos e científicos, o plano de saúde deve cobrir o trastuzumabe deruxtecana, independentemente de a indicação constar expressamente na bula (uso off label).
No caso das indicações previstas na bula aprovada pela Anvisa - como o tratamento de pacientes com câncer de mama HER-2 positivo irressecável ou metastático, com exposição prévia a duas ou mais linhas de tratamento sistêmico -, a discussão sobre a obrigatoriedade de cobertura é recorrente e amplamente analisada pelo Poder Judiciário.
Já nas situações de uso off label, a possibilidade de custeio pelo plano de saúde costuma ser avaliada caso a caso, considerando a existência de prescrição médica devidamente fundamentada e o respaldo em evidências científicas sobre a eficácia do medicamento para a condição tratada.
Em muitos casos, a negativa de cobertura ocorre sob o argumento de que o medicamento ainda não foi incluído no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), mesmo quando há indicação médica conforme a bula.
No entanto, a ausência de determinado medicamento no rol da ANS tem sido amplamente discutida no âmbito jurídico, especialmente após o reconhecimento do caráter exemplificativo desse rol.
Isso porque o rol da ANS não pode se sobrepor às disposições da Lei dos Planos de Saúde. De acordo com a legislação, um dos principais critérios para a análise da cobertura de medicamentos é a existência de registro sanitário junto à Anvisa e a certificação científica para o tratamento.
O trastuzumabe deruxtecana obteve registro na Anvisa em outubro de 2021, o que reforça a discussão jurídica acerca da possibilidade de cobertura pelos planos de saúde, mesmo antes de eventual inclusão no rol da ANS.
Diante desse contexto, a negativa baseada exclusivamente na ausência do medicamento no rol da ANS tem sido questionada judicialmente, cabendo a análise do caso concreto, da prescrição médica e do respaldo científico da indicação.
Em regra, os planos de saúde costumam negar a cobertura do trastuzumabe deruxtecana quando a indicação médica não corresponde às hipóteses previstas na bula aprovada pela Anvisa, situação conhecida como uso off label.
A justificativa apresentada, em geral, é a de que a ausência de indicação em bula caracterizaria o tratamento como experimental, o que afastaria a cobertura contratual.
No entanto, do ponto de vista técnico e científico, o uso off label não se confunde com tratamento experimental.
O uso off label ocorre quando o medicamento possui registro sanitário na Anvisa, mas é prescrito para uma finalidade ainda não descrita na bula, desde que haja respaldo científico para a indicação.
Já o tratamento experimental é aquele que não possui comprovação científica suficiente quanto à sua eficácia e segurança.
No caso do trastuzumabe deruxtecana, embora algumas indicações ainda não constem formalmente na bula no Brasil, existem estudos científicos que embasam sua utilização em determinadas situações clínicas, como em alguns tipos de câncer com expressão HER2.
Por esse motivo, a negativa de cobertura baseada exclusivamente no caráter off label da prescrição tem sido objeto de análise no âmbito jurídico, devendo cada caso ser avaliado individualmente, à luz da prescrição médica, das evidências científicas disponíveis e das condições contratuais do plano de saúde.
A discussão sobre a cobertura do trastuzumabe deruxtecana pode envolver diferentes tipos de planos de saúde, como planos individuais, familiares, empresariais ou coletivos por adesão.
Em geral, a análise da obrigação de custeio não se limita ao nome da operadora ou à modalidade do contrato, mas considera fatores como a existência de prescrição médica fundamentada, o registro do medicamento na Anvisa e o respaldo científico da indicação.
Tanto nas hipóteses previstas em bula quanto em situações de uso off label, a possibilidade de cobertura costuma ser avaliada caso a caso, levando em conta as condições contratuais e o entendimento jurídico aplicável.
Diante de eventual negativa, a questão pode ser objeto de análise no âmbito judicial, especialmente quando a recusa se baseia exclusivamente na ausência do medicamento no rol da ANS ou na indicação fora da bula, sem considerar a fundamentação médica apresentada.
O fornecimento de medicamentos de alto custo pelo Sistema Único de Saúde (SUS), como o trastuzumabe deruxtecana, pode envolver procedimentos administrativos e judiciais próprios, que variam conforme o ente federativo responsável (União, Estado ou Município).
Em alguns casos, mesmo após decisão judicial favorável, o cumprimento da ordem pode demandar prazos variáveis, em razão da complexidade administrativa do sistema público de saúde.
Já quando o paciente é beneficiário de plano de saúde, a análise sobre a cobertura do medicamento segue regras contratuais e normativas específicas da saúde suplementar, o que pode resultar em dinâmicas distintas quanto ao cumprimento de decisões judiciais.
Diante dessas diferenças, a definição da via mais adequada para buscar o acesso ao tratamento depende da análise do caso concreto, considerando fatores como a situação clínica do paciente, a existência de plano de saúde ativo e os aspectos jurídicos aplicáveis.
Há registros de decisões judiciais que analisaram pedidos de cobertura do medicamento trastuzumabe deruxtecana por planos de saúde, tanto em situações previstas em bula quanto em hipóteses de uso off label.
Em alguns desses casos, os tribunais consideraram relevantes fatores como a existência de prescrição médica fundamentada, a comprovação da necessidade clínica do tratamento, o registro sanitário do medicamento na Anvisa e a demonstração de risco ao paciente em caso de atraso no início da terapia.
As decisões judiciais costumam destacar que a negativa de cobertura baseada exclusivamente na ausência do medicamento no rol da ANS ou na indicação fora da bula deve ser analisada à luz do caso concreto, considerando os direitos do paciente e as normas aplicáveis à saúde suplementar.
Importante ressaltar que cada processo é avaliado individualmente pelo Poder Judiciário, e o resultado depende das circunstâncias específicas de cada situação, da documentação apresentada, como um bom relatório médico, e do entendimento do juízo competente.
Em ações judiciais que discutem o fornecimento do trastuzumabe deruxtecana por planos de saúde, é comum que o Poder Judiciário analise determinados documentos para avaliar a necessidade e a urgência do tratamento.
Entre eles, destacam-se o relatório médico detalhado, que descreve o quadro clínico do paciente e fundamenta a indicação do medicamento, bem como a negativa de cobertura formalizada pela operadora de saúde.
Esses documentos permitem ao juiz compreender as razões médicas da prescrição e os fundamentos apresentados pelo plano de saúde para a recusa do custeio.
A análise da viabilidade da ação e da documentação necessária depende do caso concreto e deve considerar tanto os aspectos clínicos quanto as normas aplicáveis à saúde suplementar.
Em alguns casos, pacientes que recorrem ao Poder Judiciário para buscar o fornecimento do trastuzumabe deruxtecana conseguem acesso ao medicamento em prazo reduzido, especialmente quando a situação clínica exige urgência.
Isso ocorre porque ações envolvendo medicamentos oncológicos costumam ser ajuizadas com pedido de tutela de urgência (liminar), um instrumento jurídico que permite ao juiz analisar a necessidade imediata do tratamento antes do julgamento final do processo.
Embora não exista um prazo fixo para a análise dessas demandas, é comum que o Judiciário priorize casos relacionados à saúde, sobretudo quando há risco de agravamento do quadro clínico.
A liminar é uma decisão provisória que, quando concedida, pode determinar que o plano de saúde forneça o medicamento conforme a prescrição médica, enquanto o processo segue em andamento.
A avaliação sobre a viabilidade desse pedido deve ser feita caso a caso, com base na documentação médica e nas circunstâncias específicas do paciente.
Além disso, não é necessário deslocamento físico para ingressar com ação judicial visando ao custeio do trastuzumabe deruxtecana pelo plano de saúde, uma vez que, atualmente, os processos judiciais tramitam, em regra, de forma eletrônica.
Os sistemas do Poder Judiciário permitem que todas as etapas do processo, desde o protocolo da ação até o acompanhamento das decisões, ocorram no ambiente digital. Em muitos casos, inclusive, eventuais audiências podem ser realizadas por videoconferência, conforme as normas do tribunal competente.
Essa estrutura possibilita que o paciente seja representado por advogado especializado em Direito da Saúde, independentemente de sua localidade, desde que observadas as regras processuais e de competência aplicáveis ao caso concreto.
Não é possível afirmar que qualquer ação judicial seja uma “causa ganha”. O resultado de um processo depende de diversos fatores, como as particularidades do caso concreto, a documentação apresentada, a fundamentação médica, o entendimento do juízo e o contexto jurídico aplicável.
A existência de decisões judiciais favoráveis em casos semelhantes indica que há precedentes reconhecendo o direito ao fornecimento do medicamento, o que demonstra a viabilidade jurídica da discussão. No entanto, isso não significa garantia de resultado.
Por esse motivo, a avaliação individual do caso é essencial, a fim de analisar riscos, possibilidades e estratégias adequadas, sempre com base nos elementos específicos da situação do paciente.

Elton Fernandes, advogado especialista em Direito da Saúde, professor de pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar da USP de Ribeirão Preto, da Escola Paulista de Direito (EPD) e do Instituto Luiz Mário Moutinho, em Recife, professor do Curso de Especialização em Medicina Legal e Perícia Médica da Faculdade de Medicina da USP, presidente da Comissão de Direito Médico e da Saúde da OAB de São Caetano do Sul e autor do livro "Manual de Direito da Saúde Suplementar: direito material e processual em ações contra planos de saúde".
ELTON FERNANDES SOCIEDADE DE ADVOGADOS
22.692.544/0001-02